Uma postagem da Ana Beatriz sobre fazer pizza ficou me cutucando hoje. Ana fala da experiência de ser uma trainee de pizzaiolo em algum lugar longe daqui. E lá pelas tantas, ao enumerar as rotinas, ela, em primeiro lugar, fala da limpeza. Sujou, limpou, usou, limpou, terminou, limpou. A descrição dela me pegou, porque, aqui vai a notícia, a Editora Contexto (SP) gostou do projeto de um novo livro (que anunciei no #39) e deu luz verde. Será na mesma linha dos anteriores, sobre temas de educação. Publiquei três livros pela Contexto, o Quando ninguém educa, o Escola Partida e o Filosofia da Educação. Na minha cabeça eles são como elos de uma corrente, fios de uma conversa, temas que vão se enovelando e indo adiante. O novo projeto, ainda sem título, quer ir ainda mais adiante. Mas, para isso, tenho que limpar bem a minha cozinha de escrita. Daí meu encantamento com o texto da Ana. Encantamento pequeno e bom. É pequeno porque um escrito não é uma pizza, de receita fixa, mas vem de algum lugar do ânimo da gente, que não muda de uma hora para outra. Bom, porque repõe essa coisa linda do bom dia, vamos lá, começar tudo de novo, limpinho, e ver no que vai dar.
A notícia é essa, então. Eu estava por aqui no rumo de um escrito de filosofia da linguagem, cujo nome de fantasia é esse, O animal digiana. Fiquei um tempão nisso, atravessei químios e radios nisso, e sigo entusiasmado no tema. Mas tem umas coisas que eu gostaria de pensar sobre escolaridade, educação, pedagogia brasileira, por aí. E essas coisas vão se acumulando no meu computador, na minha mesa. E eu limpo e limpo e limpo a mesa, mas elas voltam. Para meu azar, os temas do Digiana se revelaram mais complicados - ou mais simples - do que eu imaginei. Enfim. Back to business. Quero passar a limpo umas coisas que são muito básicas, como as pizzas. O que é uma escola, por exemplo? Se eu não posso adiantar o título do livro, posso dizer que ele gira em torno dessa pergunta. E antes que vocês me tirem para bobo, me justifico. Para quem setenta e alguns anos, como eu, as respostas para essa pergunta - o que é uma escola? foram as mais loucas possíveis, uma vertigem só. Para manter a comparação, teve de tudo, até pizza de chocolate, essa aberração impensável.
O livro pretende ir nesse rumo, uma reflexão sobre o lugar da escola, hoje. Antes de montar essa pizza, o que mais me importa é limpar a mesa, as facas, colheres e garfos, pratos, o fogão, as panelas, o chão. O escrito da Ana me levou a lembrar que essa coisa de escrever, se não for precedida e mantida pelo “detalhe comezinho, sem lustro e brilho” da limpeza da cozinha, pode ser apenas mais um pouco de tretas com letras.
Alguns assinantes dessa newsletter pagaram para ler sobre os temas de filosofia da linguagem que o Digiana prometeu. Diante do fato que vou reorientar um tanto os temas, me consolo com isso, a largueza espiritual deles é tamanha que vão compreender essa breve e leve guinada.
PS: Tem o assunto do Renato. Obrigado a todos que me escreveram sobre o Renato. A minha ideia era escrever um pequeno livro sobre ele e tudo o mais que cerca o assunto, mas ainda não me sinto seguro sobre isso. A ver. Obrigado.
Notícia de um livro novo do Ronai me deixa cheia de expectativas. Aprendi, com ele, a limpar (e muito) meu texto. Tenho gratidão sem-fim. Agora, resta aguardar a limpeza que ele promete, e já ficar no aguardo da pré-venda para não perder esse fio de jeito nenhum.
Sucesso na empreitada, professor. Vou ficar curioso para ler, até porque o que li sobre (tirando Rubem Alves) apontavam o que é escolar muito para um sentido de local institucionalizado de ensino, e para mim a escola está mais para um lugar compartilhado de aprendizado, que vai um tanto além do primeira colocação. Acho que o senhor tende a concordar com a última visão. Abraços!